Palavras de Rui Barbosa, naquele discurso de 1914 no senado e tão atuais ...
Sinto vergonha de mim por ter sido educador de parte desse povo, por ter batalhado sempre pela justiça, por compactuar com a honestidade, por primar pela verdade e por ver este povo já chamado varonil enveredar pelo caminho da desonra.
Sinto vergonha de mim por ter
feito parte de uma era que lutou pela democracia, pela liberdade de
ser e ter que entregar aos meus filhos, simples e abominavelmente, a
derrota das virtudes pelos vícios, a ausência da sensatez no julgamento
da verdade, a negligência com a família, célula-mater da sociedade, a
demasiada preocupação com o "eu" feliz a qualquer custo, buscando a
tal "felicidade" em caminhos eivados de desrespeito para com o seu
próximo.
Tenho vergonha de mim pela
passividade em ouvir, sem despejar meu verbo, a tantas desculpas
ditadas pelo orgulho e vaidade, a tanta falta de humildade para
reconhecer um erro cometido, a tantos "floreios" para justificar atos
criminosos, a tanta relutância em esquecer a antiga posição de sempre
"contestar", voltar atrás e mudar o futuro.
Tenho vergonha de mim pois faço parte de um povo que não reconheço, enveredando por caminhos que não quero percorrer...
Tenho vergonha da minha
impotência, da minha falta de garra, das minhas desilusões e do meu
cansaço.Não tenho para onde ir pois amo este meu chão, vibro ao ouvir
meu Hino e jamais usei a minha Bandeira para enxugar o meu suor ou
enrolar meu corpo na pecaminosa manifestação de nacionalidade. Ao lado
da vergonha de mim, tenho tanta pena de ti, povo brasileiro!"
De tanto ver triunfar as
nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a
injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o
homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha
de ser honesto".
E o pior de tudo isso é a
atualidade dessas palavras, que, se hoje fossem proferidas, fariam o
mesmo sentido, teriam a mesma validade, seriam perfeitas para retratar
o momento atual por que passa o nosso Congresso Nacional e o país.
Não é isso fruto da genialidade
inconteste de Rui Barbosa, mas da nossa teimosia de errar como nação,
na nossa insistência em permanecer baseados em preceitos falsos, em
praticar um moralismo fingido, um empreguismo deletério no governo, a
um uso da máquina pública em uso próprio que envergonha a todos.
Nosso povo segue sendo um
escravo da sua própria deficiência, alimentando um esquema que o
consome, num motocontínuo que vara os séculos e não se soluciona
porque a sua solução implica na morte desse esquema que se mantém pela
deficiência.
Rui Barbosa
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