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VER E NÃO VER - http://deficienciavisual14.com.sapo.pt/r-Ver_e_nao_ver-Oliver_Sacks.htm
Cegueira Cortical (Síndrome de Anton; Negação Psíquica da Cegueira)
Perda total da visão em todo ou parte do campo visual devido a disfunção ou dano do lobo occipital lateral (i.e., córtex visual). A síndrome de Anton é caracterizada pela negação psíquica da cegueira cortical orgânica verdadeira. (Tradução livre do original: Adams et al., Principles of Neurology, 6th ed, p460)
Mais informaçãoMais informação
- DeCS - Descritores em Ciências da Saúde.
- Casos registrados (traduzidos do inglês por Altavista Babel Fish).
- MEDLINE - Publicaçãos da Biblioteca Nacional da Medicina (multilingüe).
- MedlinePlus - Informação da saúde da Biblioteca Nacional da Medicina (espanhol).
Ver e alucinar
Outro
dia, levei aos meus alunos cartões com duas pequenas figuras: um sinal
cruzado e uma bolinha preta; ambas sobrepostas a um fundo claro e
padronizado como uma cortiça.
Pedi,
então, que eles fechassem o olho esquerdo, fixassem o olhar no sinal
cruzado e aproximassem lentamente o cartão. Há um momento neste trajeto
em que uma das imagens (no caso, a bolinha preta) irá “desaparecer”. O
experimento foi feito, pela primeira vez, em 1668 pelo filósofo e
matemático francês Edme Mariotte. Por acaso, ele descobriu que há um
espaço na retina sem fotorreceptores. Este ponto cego de cada olho é
compensado pelo outro, o que faz com que, em condições normais, não o
percebamos. Mas o que há de surpreendente não é o ponto cego. Ocorre que
quando a figura alternativa desaparece do campo de visão, nosso cérebro
preenche aquele espaço com o padrão do fundo da figura. Passamos,
então, a ver algo que não existe. Quem fizer o teste poderá
legitimamente se perguntar: mas se o que estou vendo não existe, então
como estou vendo?
A
resposta da ciência para este fenômeno é tão simples quanto
perturbadora. Ela começou a ser construída no século XIX quando Hermann
von Helmholtz, médico e fisico alemão, desconfiou que a visão não era só
aquilo que a luz trazia à retina e, daí, ao cérebro. Ele concluiu que o
cérebro fazia pressupostos a partir da experiência anterior. Em outras
palavras: ver seria mais propriamente a atividade cerebral de situar
informações dentro de paradigmas ou molduras de sentido; um processo
automatizado e inacessível à consciência. Os cientistas sabem que o
córtex visual é um sistema neural complexo com subsistemas
especializados. Alguns lidam com cores, outros com movimento, com
bordas e, assim, sucessivamente. O cérebro processa as diferentes
informações para totalizar, ainda que no erro, uma imagem dotada de
sentido. Daí as ilusões de movimento que algumas gravuras produzem, ou a
programação genética que nos faz ver imagens na madeira, em azulejos ou
nuvens, por exemplo. O mesmo processo explica a chamada Síndrome de
Anton, distúrbio em que a cegueira produzida por derrame cerebral não é
reconhecida pelos pacientes.
Nestes
casos, as pessoas afetadas seguem “vendo”, mas as imagens produzidas só
existem nas tempestades produzidas pelo turbilhão de seus neurônios.
Suas respostas inexatas sobre a realidade não são mentiras, mas ilusões
de um cérebro danificado que segue tentando totalizar as impressões
circundantes. Por isto, sindrômicos de Anton só começam a perceber que
algo está errado quando passam a esbarrar em objetos. As repercussões
epistemológicas destas descobertas são evidentes e soterram as
pretensões de neutralidade ou objetividade para todo o sempre. Ver e
alucinar, afinal, talvez sejam mesmo verbos siameses. Lembrar disto nos
ajudará a desconfiar mais do que vemos e a nos preocupar com o que
deixamos de ver.
Dica:
Quem tiver interesse nestes temas, terá muito prazer ao ler o recém
lançado “Incógnito: as vidas secretas do cérebro”, de David Eagleman
(Rocco, 286 pg.).
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